28 DE SETEMBRO – DIA LATINO AMERICANO E CARIBENHO DE LUTA PELA
LEGALIZAÇÃO DO ABORTO
Pela não criminalização das mulheres.
Pela legalização do aborto.
O dia 28 de setembro, conhecido como Dia de
Luta pela Legalização do Aborto na América Latina e Caribe, foi
estabelecido no Congresso de Mulheres de 1990, ocorrido na Argentina e
precedido pelos Encontros Feministas da América Latina e Caribe,
que começaram a ocorrer em 1981, com a primeira reunião em Bogotá, Colômbia.
As realizações destes encontros marcam as conquistas das mulheres
latino-americanas e caribenhas impulsionando-as às ruas para defenderem o
direito de decisão sobre nossos corpos e contra o patriarcado capitalista,
integrando-nos numa rede de feministas que constroem um espaço de lutas de
compartilhamento de ideias, propostas, experiências, problemas e, claro,
sonhos.
Sem prisões nem mortes
Contrariando todas as pesquisas nas quais apontam
que a maioria da população brasileira é contrária à prisão da mulher por ter
feito aborto, estamos vivendo um momento de regressão e de perda de direitos
nesse campo.
Diversos são os projetos no Legislativo,
apresentados por parlamentares conservadores, como o do Estatuto do Nascituro,
que proíbem o aborto até mesmo em casos de estupro e risco de vida às mulheres,
hipóteses atualmente permitidas. Esses projetos passaram a proibir, direta e
indiretamente, a discussão e apreciação de ações judiciais protetoras dos
direitos das mulheres no STF, proibindo a inclusão da questão de gênero
nas escolas com apresentação de outras medidas ultraconservadoras.
Recentemente aventou-se, até mesmo, a
hipótese de garantir aos violentadores a formalização da paternidade!
No governo Bolsonaro, aqueles que defendem o
processo de criminalização são os mesmos conservadores e fundamentalistas que
impedem as iniciativas de educação sexual para adolescentes, que refutam as
questões de gênero na educação fundamental e média, que lutam contra a
distribuição e venda de contraceptivos de emergência, que impedem as mulheres de
terem acesso às informações seguras sobre métodos de aborto e que limitam os
recursos na área da saúde.
Nossa Saúde e o Controle sobre nossos corpos
Em 1968, a ONU reconheceu o direito de todas as
pessoas escolherem, livre e responsavelmente, o número de filhos que desejam,
no entanto, no Brasil não há planejamento familiar, mas, sim, a eterna
tentativa de controlar o corpo da mulher.
Os contraceptivos continuam não acessíveis a todas
as mulheres, não há conexão entre saúde e educação, são limitados os recursos
para o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM).
Na década de 1970, o Movimento Feminista e de
Mulheres que atuavam na área da saúde, criticando a atuação das clínicas
privadas de planejamento familiar, vão, juntamente com médicas/os e
sanitaristas, discutir e propor a criação de um Sistema Único de Saúde (SUS)
procurando garantir acesso igualitário e universal aos serviços, como é até
hoje, mas com um lento sucateamento para o retorno das clínicas privadas.
Tempos depois advém a Previdência Social com uma
inovação, a de ter, além de uma legislação pertinente, também um corpo teórico
próprio depois abarcado pelo mundo acadêmico (uma inovação do professor e
jurista Aníbal Fernandes). A preocupação com a saúde da mulher não pode ser
apenas no momento da gravidez ou do parto, justificando a criação do PAISM[i].
O certo é que o PAISM, revolucionariamente, rompe
com a visão restritiva da saúde da mulher atrelada ao ciclo da gravidez, até
porque, prevenir gestações não desejadas reduz o recurso ao aborto e este,
enquanto não for descriminalizado, gerará as mortes das mulheres as mais
pobres, jovens e negras, para as quais, de acordo com o Ministério da
Saúde, o risco de morte por aborto inseguro é 2,5 do que para mulheres brancas.
É por isso que as mulheres lutam por justiça
reprodutiva, ou seja, o direito humano a não ter ou ter filhos, o direito à
livre expressão da sexualidade, à autonomia do próprio corpo!
Políticas públicas voltadas para o controle de
epidemias, infecções sexualmente transmissíveis, saúde reprodutiva, fim da
violência obstétrica, defesa da saúde pública, ruptura de classes, enfim, saúde
integral das mulheres é que lhes trazem segurança. Políticas públicas para uma
vida digna para as mulheres e focadas na superação da violência, dos
preconceitos e, obviamente, na ampliação da rede de serviços para atender as
demandas das mulheres: trabalho, creches, atendimento humanizado para além do
parto, antes de depois dele.
Não há parto humanizado desvinculado do acompanhamento da saúde integral
da mulher
A violência contra as mulheres gestantes, chamada pelos
movimentos sociais de “violência obstétrica”, caracteriza-se pelas práticas de
recusa de atendimento médica, na não oitiva das mulheres, nas agressões verbais
e psicológicas, em procedimentos médicos desnecessários nas fases do pré-natal,
no parto e após o parto.
O estímulo ao parto cesariano guarda relação direta
com as regras do capitalismo e a prática do parto menos demorado, com menor
tempo de atendimento, mais produtivismo, mercantilização e, ainda, propiciando
a realização de laqueaduras.
O Governo Bolsonaro, que é, acima de tudo, contra
todas as mulheres, exigiu que, oficialmente, o Ministério da Saúde retirasse a
expressão nominal “violência obstétrica” dos seus documentos, negando e
negligenciando, portanto, o problema que afeta milhões de mulheres.
Os governos estaduais, como o de Dória, em São
Paulo, através da Lei nº 435/2019, passaram, então, a incentivar as cesáreas.
O aborto na sociedade de classes
Numa sociedade de classes, criminalizar o aborto é
criminalizar pobreza já que mulheres ricas são atendidas em
clínicas, ainda que ilegais, com bons profissionais, bem aparelhadas, seguras,
e, obviamente caras, portanto, não acessíveis às mulheres pobres, às
trabalhadoras, para as quais resta a gravidez indesejada com todas as suas
consequências e sequelas, com prisões e, muitas vezes, a própria morte.
Por medo de ser denunciada, a mulher acaba por
realizar o procedimento no ambiente doméstico, sem proteção e que, muitas
vezes, a leva para o SUS para realização de curetagem e onde, com frequência, a
mulher acaba por ser atendida com discriminação em função da tentativa
frustrada de aborto.
Nessa sociedade de classes, a reprodução assistida
é apenas para as mulheres da burguesia, já que o SUS nega, em geral, esse tipo
de assistência. Assim, o capital sacraliza a vida, mas não
apoia a mulher trabalhadora quando essa quer gerar uma vida!
Nenhuma mulher deseja o aborto, mas, no estado
burguês, há quase que uma impossibilidade social de controle da própria
sexualidade na medida em que a gravidez indesejada é resultante de situações
sociais estruturais do capitalismo: violência sexual, recusa de uso de métodos
contraceptivos por parte dos homens, falhas nos métodos, limites aos acessos à
informação e aos métodos, desemprego, isolamento, maternidade compulsória,
monogamia como regra, etc.
A escolha da mulher no capitalismo, com seu teor
limitado e liberal, ocorre no contexto da economia de mercado e de
comercialização. A tomada de decisões reprodutivas não está isenta desta
influência onde reprodução e economia se imbricam na base material: o aborto, o
parto e a criação e educação de crianças têm um custo real e mercantil.
Para tanto, nós, do Coletivo Feminista Classista
Ana Montenegro, defendemos que é necessário continuar lutando contra a posição
política de tratar o aborto como assunto penal ou de polícia, devendo o mesmo,
em contrapartida, ser trazido para o campo da política pública de saúde
integral à mulher, apontando, portanto, para a legalização do aborto como caso
de saúde pública e de responsabilidade estatal, como forma de respeito à
decisão soberana das mulheres sobre suas vidas, seus corpos e sexualidade. Sem
a exploração no trabalho, a escravização moral e sexual a que estão
ideologicamente sujeitas as mulheres no patriarcado, no capitalismo.
A
sociedade socialista facilitaria essa perspectiva!
Mercedes Lima
[i] Luta que tem à frente as
(os) comunistas do PCB – Partido Comunista Brasileiro – assim como na
Previdência, também do PCB, o professor e jurista previdenciário Aníbal
Fernandes.
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