quarta-feira, 31 de outubro de 2018




Mulher negra e a exploração no mercado de trabalho.

            O Brasil, de acordo com a Organização para Cooperação do Desenvolvimento Humano - OECD, ficou em 1° lugar no ranking de países com os maiores índices de desigualdade salarial. Tal desigualdade torna-se ainda mais evidente quando da realidade das mulheres negras, que chegam a ganhar de 60% a 80% menos que um homem branco.
            Já se sabe que as negras sempre foram exploradas e sempre exerceram postos de trabalho precarizados, desvalorizados, subjugados e estigmatizados. Atualmente ainda são as mais atingidas pela desigualdade de raça e gênero no mercado de trabalho. Diz-se, com isso, que as escravizadas de ontem são as periféricas e ocupantes dos cargos de trabalhos mais explorados de hoje.
            Além disso, o nível de desemprego é maior entre as mulheres negras, chegando a 12%, enquanto para homens brancos o índice é de 5,3%. Porém, quando da situação de emprego, normalmente passam a exercem os piores cargos, ainda que qualificadas. Nesse sentido, de acordo com a SEAC-RJ, 90% dos trabalhadores de limpeza são mulheres e 62% são negros.
          Ainda quanto ao ambiente do trabalho, é válido pontuar a questão do , moral e sexual no trabalho, caracterizado pela exposição das trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas. Embora os homens também possam ser vítimas do assédio, estatísticas do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE revelam que 73% do assédio moral é sofrido por mulheres, na sua maioria negras – muitas vezes vítimas do assédio sexual pela forma como o capital objetifica e hipersexualiza seu corpo.
            Como defende Angela Davis, “ser mulher negra no Brasil já é em si resistência. E já traz, por si, mesmo que não de maneira organizada, um sentimento capitalista”. Deste modo e diante os índices apresentados, cumpre concluir que as mulheres negras são as que mais sofrem com as desigualdades por questão raça e de gênero, estando em pior situação em relação à renda, segurança, trabalho, educação, entre outros direitos fundamentais e sociais mais. Isto porque, para sustentar esse sistema, foi preciso um alicerce ideológico que legitimasse a inferiorização de um povo, que se configura em amarras vestidas com uma nova roupagem no sistema capitalista. O racismo está enraizado na formação do país em todas as suas esferas e, às mulheres, a essas mulheres restou somente a hipersexualização ou a desvalorização do seu papel.
            A fim de mudar o referido cenário, enfatiza-se  luta para reduzir os danos sociais que afetam toda sociedade, fundamentada na conscientização e na mudança de comportamento das massas oprimidas. O conhecimento de tais prejuízos trazidos por um sistema ultrapassado por seus próprios meios exploratórios, não pode continuar a vitimar a população periférica. Temos a certeza de nosso dever histórico em romper com tal realidade, construindo uma nova sociedade mais emancipada e igualitária. Para isso, devemos nos organizar e direcionar nossa luta na percepção da origem de tais tais confrontos dentro da civilização, onde deve-se ressaltar a importância de se caracterizar e identificar como excluído, como prejudicada e como população que precisa ser ouvida e também atendida. A percepção do problema é de máxima urgência, afinal, não se pode mais aceitar, se conformar ou tolerar tamanha desigualdade social.
          Para isso, denunciamos toda e qualquer violência e omissão estatal e corporativa que perpetre violências de raça, gênero, classe e sexualidade; combatendo estereótipos, negligências, submissões, subjugações e explorações, isto porque reconhecemos que os sistemas de exploração e opressão – machismo e racismo – fazem as trabalhadoras negras e indígenas, serem ainda mais espoliadas e violentadas, com tendência a um aumento paulatino do acirramento da barbárie contra esses grupos dentro do capitalismo, especialmente dentro dos espaços de disputa do trabalho.
          Nesta oportunidade saudamos as seguintes mulheres negras que, por seus ofícios e sua militância, marcaram a história para além do mundo do trabalho, alcançando avanços de emancipação humana: Carolina Maria de Jesus, escritora e poetisa; Benedita da Silva, assistente social; Lélia Gonzalez, professora; Luiza Mahin, quituteira; Maria Clara Araujo, pedagoga; e, Marielle Franco, socióloga e vereadora, PRESENTE!

sexta-feira, 26 de outubro de 2018




Dia Internacional contra a Exploração da Mulher – Lutamos e Resistimos!

Dia 25 de outubro: Dia Internacional contra Exploração da Mulher. A exploração e opressão conformadas sob as estruturas patriarcais reproduzem historicamente formas de dominação que ceifam a vida de mulheres, que alijam suas condições de trabalho e que as aprisionam ao espaço doméstico. Lembremos que o movimento feminista ao longo de sua história foi responsável por conquistas fundamentais, contudo, vemos que ainda hoje as desigualdades de gênero são perpetuadas em nossa sociedade por meio de diversas instâncias.  
Dados sobre a realidade brasileira expressam os diferentes condicionantes através do qual as mulheres estão submetidas cotidianamente. O Brasil ocupa a 5° posição em taxa de homicídio de mulheres entre um grupo de 83 países (Mapa da Violência 2015); em geral, as mulheres recebem 79% comparado à remuneração média dos homens; as mulheres negras, por sua vez, recebem 39% em relação aos rendimentos dos homens brancos (Cienc. Cult. vol.58 n.4, São Paulo Oct./Dec. 2006); e, as mulheres são responsáveis por 73% mais de horas dedicadas as tarefas domésticas do que os homens. (https://oglobo.globo.com/sociedade/mulheres-dedicam-73-mais-tempo-do-que-homens-afazeres-domesticos-22462181).   
Estes dados tornam-se ainda mais agravantes quando nos deparamos à atual conjuntura brasileira.  Declarações homofóbicas, racistas e machistas ganharam lugar comum no Brasil e isto não é produto do acaso. Nos últimos anos enfrentamos ações institucionais e movimentos que atacavam e atacam diretamente pautas feministas com o claro objetivo de deslegitimar a luta das mulheres e de retirar direitos conquistados ao longo de séculos de mobilizações e enfretamentos. Desde projetos como o do Estatuto Nascituro e o Estatuto da Família, até a Marcha com Deus pela Liberdade, o Movimento pela Vida e as hostilizações acerca da suposta “Ideologia de Gênero”, anunciavam os retrocessos que hoje se materializam na figura de Jair Bolsonaro. O conservadorismo apregoado por setores religiosos e em nome da “família, moral e bons costumes” ganha aspectos fascistas ameaçando qualquer garantia de liberdade democrática. O discurso de ódio e a “guerra cultural” emprenhada contra os grupos mais oprimidos e difundidos por tal candidatura demonstram que o combate a dominação patriarcal não se dará sem a reação daqueles que tem seu lugar de poder posto em xeque, e que estes já começaram a lançar de mecanismos de violência para garantir seus privilégios. 
Em períodos de crise econômica e política, além de avanço do conservadorismo, também são iminentes políticas de austeridade que atingem com mais força as mulheres trabalhadoras. O capital que extrai valor, educa e desagrega a organização da classe trabalhadora, sempre utilizou dos grupos minoritários e das mulheres como subcategorias para justificar a exploração ainda mais degradante dessa população. Assim, a Reforma Trabalhista aprovada cairá principalmente nos ombros das mulheres, que já recebem os menores salários, ocupam postos de trabalhos considerados inferiores, sofrem assédio moral diariamente em seus trabalhos, além de enfrentar uma tripla jornada uma vez que é responsabilizada pelo serviço doméstico e de cuidado à família. Cortes de gastos públicos, que incluem serviços de socialização dos cuidados como creches e hospitais, aumentará a carga do trabalho doméstico das mulheres.
Nesse contexto, as mulheres, já acometidas pela estrutura patriarcal e machista, serão cada vez mais jogadas à margem da sociedade. Neste dia, portanto, não apenas rememoramos esta data, mas reafirmamos que a luta pelo fim da opressão e exploração da mulher continua mais necessária do que nunca nos dias atuais. Apontamos, deste modo, para um horizonte que deve ser almejado por nós feministas classistas: a organização das lutas das mulheres trabalhadoras e o fortalecimento de um feminismo que abarque a luta e a vida das mulheres trabalhadoras, que se proponha a revolucionar a vida de toda nossa classe, como nós designamos, um feminismo classista.


quarta-feira, 17 de outubro de 2018



Mulheres e eleições: para além da representatividade

            Em um ranking de 190 países sobre a presença feminina em parlamentos, o Brasil amarga a 152ª posição, com apenas 10,5% de mulheres na Câmara dos Deputados[1]. Em 2009, o Tribunal Superior Eleitoral passou a exigir um mínimo de 30% de candidaturas femininas nos partidos, além de 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha fossem destinadas às candidaturas femininas. No entanto, o que a maioria dos partidos políticos brasileiros faz é encontrar uma maneira de cumprir a lei, lançando apenas o mínimo exigido de candidaturas e ainda fazendo uso de “candidatas-fantasma”, isto é, registro de candidaturas femininas sem o conhecimento das próprias candidatas ou que, apesar de registradas, não recebem a verba do fundo partidário[2].
            A ausência de mulheres na política brasileira também é evidente no poder Executivo, tendo ficado patente após o Golpe de 2016 quando, pela primeira vez em 37 anos, instituiu-se uma equipe ministerial sem nenhuma mulher. Nada surpreendente vindo de um presidente ilegítimo e reacionário que tirou da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres o status de ministério e que reduziu o papel das mulheres às funções domésticas ao tentar “homenageá-las”[3].
            Uma análise sobre a política nacional e internacional dos últimos anos evidencia que a representatividade importa, mas não basta. Ao mesmo tempo que o aumento da participação feminina representa um avanço civilizacional, sabemos que não basta pertencer à minoria, é preciso realmente fazer política para a minoria.
            E o que significa isso?
            Sabemos que o capitalismo se beneficia das opressões, pois para ele é conveniente que existam grupos marginalizados e estigmatizados – como mulheres, afrodescendentes, indígenas e LGBTs – criando subclasses de trabalhadores e um exército de reserva, facilitando, dessa forma, uma maior extração de mais-valia do trabalho desses grupos.
            Por esse motivo, ao nos depararmos com candidaturas que afirmam representar as minorias, precisamos analisar em que consiste seus programas políticos. Como uma candidata que afirma ser defensora das mulheres pode ser contra o direito ao aborto e não ser feminista? Como um candidato negro pode ser radicalmente contrário às cotas raciais e ao Dia da Consciência Negra?
            Sabemos que representatividade vende e dá votos, por isso é preciso sempre fazer uma avaliação crítica nesses tempos eleitorais. Muitos partidos tradicionais têm lançado, de forma oportunista, candidaturas com essa fachada representativa das minorias. Até mesmo Geraldo Alckmin recentemente declarou apoio ao #elenão, em um oportunismo grotesco da luta das mulheres contra o fascismo que ele e seu partido, ao se aliarem com os setores mais conservadores da política para tramar o golpe de 2016, ajudaram a alimentar.  E o que dizer de sua vice, Ana Amélia, que é representante do setor agropecuário, contrária ao aborto e cortejada pelo MBL?
            São figuras que defendem as reformas trabalhistas e da previdência, o congelamento do teto de gastos, o Escola sem Partido, e todas essas medidas que golpeiam a classe trabalhadora e, principalmente, as minorias já precarizadas.
            Desde o brutal assassinato de Marielle Franco, intensificou-se um movimento para a eleição de mais candidatas mulheres. Sabemos, no entanto, que Marielle incomodou o status quo não só por ser negra, feminista e lésbica, mas porque e, principalmente, por sua militância socialista e obstinada contra a militarização do Rio de Janeiro.     Como observou a militante e teórica Angela Davis, “numa sociedade racista, não basta não ser racista, é preciso ser anti-racista”. Por isso, candidaturas que realmente representem esses grupos devem opor-se de forma intransigente a essas medidas de retiradas de direitos dos trabalhadores e de viés autoritário. Essas candidaturas devem autoproclamar-se feministas e combater firmemente o racismo, o neoliberalismo, a repressão e o fascismo.
            Afinal, como também afirmou a própria Angela Davis, “Eu preferiria um candidato branco, que criticasse o capitalismo, o inter-racismo e as prisões do que um candidato negro que é do status quo”. Para isso, nós do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro não desassociamos nossas bandeiras políticas das pautas classistas e revolucionárias. É necessário resgatarmos as lutas históricas, muitas com origem em cenário socialista e trabalhista, desvencilhando-as de um viés meramente identitário, empoderador, movimentista e representativo.



[1] https://g1.globo.com/politica/noticia/em-ranking-de-190-paises-sobre-presenca-feminina-em-parlamentos-brasil-ocupa-a-152-posicao.ghtml
[2] https://www.cartacapital.com.br/diversidade/como-identificar-possiveis-candidatas-laranjas
[3] https://brasil.elpais.com/brasil/2017/03/08/politica/1489008097_657541.html

quarta-feira, 10 de outubro de 2018



Dia Nacional de Luta contra a Violência à Mulher

            “Violência de gênero, inclusive em suas modalidades familiar e doméstica, não ocorre aleatoriamente, mas deriva de uma organização social de gênero, que privilegia o masculino”: assim discorre Heleieth Saffioti em sua obra “Gênero, patriarcado e violência” (2011, p. 81).
            Através do trecho narrado, é possível iniciar uma discussão em torno da bandeira levantada no dia 10 de outubro de cada ano, pela luta nacional contra a violência à mulher, perpassando por questões socialmente enraizadas que obrigam a militância feminista a atuar não somente no pós-violência – quando do acolhimento e orientação à vítima –, mas também na prevenção, quando da educação social e dos estudos de teorias historicamente acumuladas sobre opressões e explorações de gênero e de classe.
            Em breve síntese, a supramencionada data surgiu no Brasil em 1980, por um grupo de paulistanas cujos enfrentamentos geraram significativos frutos como a sanção da Lei nº 11.340/2006 – Lei Maria da Penha – e que, atualmente, possui como objetivo principal o fomento à utilização dos serviços da Central de Atendimento à Mulher – o disk 180 – mantida pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), pelas mulheres em situação de violência doméstica, familiar ou afetiva.
            Com base no até aqui exposto, nota-se que é possível discorrer sobre a violência contra a mulher através de dois simultâneos e importantes olhares: o primeiro, pela compreensão dos direitos das mulheres e o conhecimento quanto aos mecanismos legislativos e judiciais existentes; e, o segundo, sobre o instante que antecede as situações de violência, ou seja, a análise histórica e teórica sobre a estrutura social que garante e legitima a submissão do gênero feminino ao masculino.
            Iniciando pela hipótese de concreta violência, é necessário que nós, militantes, conheçamos a Lei Maria da Penha – o que não nos isenta de tecer críticas sobre suas limitações dentro da superestrutura burguesa – e tenhamos domínio de suas previsões, orientações e diretrizes. Tal destreza possibilita que instrumentalizemos cada vez mais mulheres que possam estar, ou que têm contato com quem esteja, em situação de agressão. Informar-se sobre tais procedimentos pode, literalmente, salvar vidas.
            Os ditames da Lei Maria da Penha aplicam-se, tão somente, em violências acometidas em ambiente doméstico – entende-se por ambiente doméstico o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas (exemplo: república de estudantes, local de trabalho ou de estudo) –; familiar – entende-se por ambiente familiar a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa (exemplo: os pais, ou irmãos, ou primos, ou cunhados, ou tios, etc.) –; e, em relações íntimas de afeto – na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação (exemplo: cônjuge, companheiro em união estável, namorado, afeto esporádico como “ficantes”, etc.). Quanto ao todo expresso, frisa-se a desnecessidade de laço sanguíneo quando da violência familiar; e, nas relações íntimas, a irrelevância de o relacionamento afetivo ainda perdurar no instante da denúncia e, muito menos, da necessidade de coabitação. Tais informações, quando não sabidas, afastam as mulheres dos direitos previstos em lei e desestimulam, até mesmo, a reivindicação de medidas protetivas.
            As violências, por sua vez, estão presentes em cinco extensões da integridade humana: física (chutes, puxões de cabelo, socos, tapas); moral (difamar, caluniar ou injuriar); psicológica (ameaçar, chantagear, humilhar, isolar, perseguir, xingar, manipular); sexual (estuprar, forçar ao aborto, exigir maternidade); e, patrimonial (esconder instrumentos de trabalho ou documentos pessoais, quebrar objetos, restringir acesso ao dinheiro).
            Superadas as considerações acima, devemos nos atentar ao fato de que a Lei Maria da Penha, prevê, também, como o Poder Público deve dispor de medidas integradas de prevenção, a forma como as autoridades policiais devem proceder quando invocadas, da assistência judiciária e do atendimento de equipe multidisciplinar. Inviável discorrer sobre cada um destes pontos nesta oportunidade, entretanto, essencial que saibamos reivindicar cada uma destas disposições que, quando efetivadas, garantem ainda mais a segurança e a integridade física e moral da violentada.
            Antes de divagar sobre as medidas protetivas, é necessário pontuar que as mulheres protegidas pela Lei nº 11.340/2006 não são só as cisgênero, mas em equivalência de direitos, a mulher transgênero e a travesti. Tal extensão de direitos, pacificada somente em 2017, é imprescindível para a efetivação da justiça, uma vez que as mulheres trans e as travestis são, conforme nos mostram os índices, as maiores vítimas de violência, atentados e homicídios. Negar esse direito seria aprofundar ainda mais o abismo social já existente, legalizar a discriminação e cometer um erro histórico irreparável.
            Quanto às medidas, cabe dividi-las em dois grupos: a-) as medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor; e, b-) as medidas protetivas de urgência concedidas à ofendida. Ao primeiro grupo pertencem as medidas concedidas pelo(a) Juiz(a) responsável com teor destinado ao agressor. Podem ser elas: suspensão ou restrição do porte de arma (em casos onde o agressor é policial militar, por exemplo), afastamento do local de convívio com a vítima (exemplo: afastamento do lar), proibição de contato com familiares da agredida (incluindo filhos menores em comum), e, até mesmo, prestação de alimentos (em casos onde a agredida ou seus dependentes dependam financeiramente do acusado). Já as medidas que são destinadas à mulher em situação de violência, destacamos: seu encaminhamento e de seus dependentes a programas sociais de proteção (exemplo: casa lar, casa abrigo, casa de passagem), separação de corpos, restituição de bens que possam ter sido subtraídos pelo acusado e suspensão de procurações e direitos que a vítima possa ter conferido ao agressor.
            A finalizar este primeiro olhar sobre a violência, é válido registrar a importância de atuação junto ao CREAS da cidade, cujas providências podem ser ainda mais fortalecidas. É indispensável que as várias hipóteses de medidas de proteção também sejam difundidas socialmente entre nós e nossos pares, uma vez que, via de regra, a medida de praxe concedida pelo judiciário é a de distanciamento, enquanto, muitas vezes, a agredida restaria mais protegida se reivindicadas as medidas de suspensão de porte de armas, prestação de alimentos ou restituição de bens, por exemplo – ainda mais quando consideradas as estatísticas que revelam uma violência mais devastadora às mulheres da classe trabalhadora, ocupantes de categorias de desemprego ou de subtrabalhos mal remunerados e precarizados, o que as tornam totalmente dependentes do salário de uma figura masculina socialmente melhor remunerada.
            Entretanto, não nos cabe apenas a atuação reparadora quando concretizada a violência. Fundamental uma insistente discussão sobre gênero e classe para que avancemos socialmente no debate, diminuindo, cada vez mais, os índices de agressão e de feminicídio. Pra isso, projetos de lei como o “Escola sem Partido” devem ser derrubados, onde, no lugar, devemos ocupar propostas de educação sexual, grupos de estudo e de debate sobre estereótipos de gênero e sobre opressões e explorações. É crucial desmitificarmos, em todos os espaços e a todo tempo, o fantasma que ronda os debates que têm potencial de arruinar essa sociedade capitalista falida e seus tentáculos do machismo, do racismo, da LGBTIfobia, etc.
            Nesse sentido, quanto à ruptura do todo posto e o objeto de nossa luta organicamente travada diariamente:

É imprescindível o reforço permanente da dimensão histórica da dominação masculina para que se compreenda e se dimensione adequadamente o patriarcado. (...) A dominação-exploração constitui um único fenômeno, apresentando duas faces. Desta sorte, a base econômica do patriarcado não consiste apenas na intensa discriminação salarial das trabalhadoras, em sua segregação ocupacional e em sua marginalização de importantes papeis econômicos e político-deliberativo, mas também no controle de sua sexualidade e, por conseguinte, de sua capacidade reprodutiva. Seja para induzir as mulheres a ter grande número de filhos, seja para convencê-las a controlar a quantidade de nascimentos e o espaço de tempo entre os filhos, o controle está sempre em mãos masculinas, embora elementos femininos possam intermediar e mesmo implementar estes projetos. (...) Não basta ampliar o campo de atuação das mulheres. Em outras palavras, não basta que uma parte das mulheres ocupe posições econômicas, políticas, religiosas, etc., tradicionalmente reservadas aos homens. Como já se afirmou, qualquer que seja a profundidade da dominação-exploração da categoria mulheres pela dos homens, a natureza do patriarcado continua a mesma. A contradição não encontra solução neste regime. Ela admite a superação, o que exige transformações radicais no sentido da preservação das diferenças e da eliminação das desigualdades, pelas quais é responsável a sociedade (SAFFIOTI, 2011, p. 105-106).

            Para isso, nós do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro não nos iludimos com as esferas legislativa e judiciária, mesmo reconhecendo algumas contribuições como válidas e essenciais para a luta e a instrumentalização cotidiana. Denunciamos diariamente as violências de classe e de gênero, incluindo as acometidas pelo Estado quando negligente e omisso às demandas do movimento feminista. Reafirmamos a necessidade de fazermos resgates teóricos que nos contemplam enquanto mulheres da classe trabalhadora, a fim de avançarmos no debate e erradicarmos, de vez, junto à ruptura radical da sociedade capitalista, a forma mais primária de submissão feminina: a violência. Para este dia 10 de outubro, defendemos, também, o fim da Polícia Militar, a ampliação da rede de atendimento às mulheres em situação de violência, bem como a reestruturação desmilitarizada das Delegacias de Defesa da Mulher.

quinta-feira, 4 de outubro de 2018



O sufrágio feminino brasileiro 

Em síntese, a luta pelo sufrágio feminino no Brasil durou mais de quarenta anos, cujos primeiros sinais que demarcaram seu início podem ser percebidos em 1891. Em 1927 tivemos o primeiro fatídico episódio brasileiro, ocorrido no Rio Grande do Norte, na cidade de Mossoró, onde, bravamente, uma professora, Celina Guimarães Viana, foi autorizada pelo então governador a votar naquele ano – mesmo tendo seu voto cassado posteriormente, o que, ainda assim, configurou um ato histórico de resistência e pioneirismo. 

Porém, só em 24 de fevereiro de 1932 o sufrágio foi legitimado pela Constituição Federal da época. Ocorre que, com restrições. Isto porque, de início, na década de 30, somente poderiam votar mulheres casadas – quando autorizadas pelos maridos – e as solteiras e viúvas que detinham renda própria. Logo, notam-se características de uma conquista, mesmo que de supraimportância, burguesa e liberal, pautada no casamento, na renda e na propriedade. Tais restrições foram legalmente eliminadas do Código Eleitoral dois anos depois da conquista, mas foi apenas em 1946 que a obrigatoriedade do voto foi estendida às mulheres de toda classe. 

Anos mais tarde, com um golpe empresarial-militar que durou mais de duas décadas, a redemocratização de 1988 foi cenário de um país abalado em sua história e afogado em dúvidas: nesse momento crucial, quem nos representaria? Trinta anos depois, no atual 2018, o Tribunal Superior Eleitoral - TSE apontou que, mesmo sendo 52% do eleitorado brasileiro composto por mulheres, o número de eleitoras politicamente ativas – de candidatas e de mulheres que ocupam posições políticas – é extremamente baixo e, quando eleitas mulheres que nos representam enquanto classe e que não têm medo de levantar nossas bandeiras relativas a trabalho, sexualidade, reprodução e violência, como Marielle Franco – vereadora, negra, lésbica, mãe solteira, que denunciava frequentemente o abuso de autoridade policial no Rio de Janeiro – são brutalmente executadas, silenciadas e ameaçadas. 

São em momentos como esse que entendemos a extrema necessidade de nos posicionarmos, elegendo candidaturas que, como nós, lutarão para o progresso de nossos direitos e não pelo retrocesso de nossas conquistas históricas. Precisamos mostrar à nossa classe – onde metade demonstra desinformação quanto as candidaturas postas e o funcionamento das políticas públicas e estatais existentes – que temos número e capacidade total de colocarmos no Senado, na Câmara e na Presidência, militantes dispostas a lutar conosco contra os ataques à democracia e aos ideais conservadores – para além das eleições e dos limites do Estado e da legislação burguesa. Sem medo de mudar o Brasil, pela defesa dos povos oprimidos explorados e pela defesa da classe trabalhadora, é que se encontram a verdadeira sustentação de todo o país e a legitimidade do sufrágio a duras penas conquistado. 

Assim, para nós do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, devemos tomar de assalto os espaços políticos, deliberativos e de enfrentamento popular, rompendo com o afastamento secular das mulheres da vida pública, onde, mesmo inserida no mundo do trabalho produtivo e tendo conquistado uma igualdade relativa e meramente legislativa, sua participação em espaços políticos ainda é muito singela. Afinal, a luta política das mulheres negras, indígenas, transexuais, comunistas e etc., é sempre apagada na história oficial, silenciada e escondida pela história de seus companheiros e, muitas vezes, absorvidas pelas tarefas burocráticas e organizacionais. 

Estamos na luta há muitos anos, porém, com maior força nesse momento presente suplicamos: devemos romper com o silêncio e nos portarmos às ruas. Nas urnas, sem mobilização por medo ou culpa, nossas candidaturas devem ser revolucionárias e classistas.

Estamos com candidaturas pelo Brasil todo. Temos candidatos e candidatas ao Senado, a deputados estaduais e federais. Pessoas de diversas idades, credos, etnias, gêneros. Somos uma partido bem diverso e que comporta o melhor da nossa classe. Votar no PCB é votar em alternativas reais de luta!